Existe uma grande diferença entre respeitar a história e pertencer a ela.
Ao respeitarmos uma história, estamos cientes dos fatos ocorridos no passado e temos plena noção de que os mesmos passam por constantes alterações diante das novas exigências do mundo contemporâneo.
Por outro lado, pertencer a uma história indica uma maior cumplicidade com os fatos ocorridos no passado, que de certa forma são preservados espontaneamente na memória coletiva, através dos nossos gestos, costumes, rituais e celebrações.
Quanto mais rápida as mudanças ocorridas em uma cidade, mais difícil será a preservação da memória coletiva e, infelizmente, as mudanças são inevitáveis. O mundo atual impõe uma atualização constante das coisas, mediante os avanços tecnológicos e capitalistas.
Primeira estação Mogiana de Batatais
O poeta Carlos Drummond de Andrade, sensível a esta necessidade do pertencimento ao passado, escreveu diversas poesias sobre a sua condição diante das principais edificações que marcaram a sua vida, sejam elas construções comuns ou prédios públicos.
Tomo a liberdade de apresentar trechos de duas poesias de Drummond, que exemplificam muito bem a relação de pertencimento entre cidadão Carlos Drummond de Andrade e os lugares de memória da cidade.
“Fechado o Cinema Odeon, na Rua da Bahia.
Fechado para sempre.
Não é possível, minha mocidade
fecha com ele um pouco.
Não amadureci ainda bastante
para aceitar a morte das coisas
que minhas coisas são, sendo de outrem,
e até aplaudi-la, quando for o caso.
(Amadurecerei um dia?)
Não aceito, por enquanto, o Cinema Glória,
maior, mais americano, mais isso-e-aquilo.
Quero é o derrotado Cinema Odeon,
o miúdo, fora-de-moda Cinema Odeon.
A espera na sala de espera. A matinê
com Buck Jones, tombos, tiros, tramas.” (O fim das coisas – Carlos Drummond de Andrade)
Fechado para sempre.
Não é possível, minha mocidade
fecha com ele um pouco.
Não amadureci ainda bastante
para aceitar a morte das coisas
que minhas coisas são, sendo de outrem,
e até aplaudi-la, quando for o caso.
(Amadurecerei um dia?)
Não aceito, por enquanto, o Cinema Glória,
maior, mais americano, mais isso-e-aquilo.
Quero é o derrotado Cinema Odeon,
o miúdo, fora-de-moda Cinema Odeon.
A espera na sala de espera. A matinê
com Buck Jones, tombos, tiros, tramas.” (O fim das coisas – Carlos Drummond de Andrade)
“Estão demolindo
o edifício em que não morei.
Tinha um nome
somente meu.
o edifício em que não morei.
Tinha um nome
somente meu.
Meu, de mais ninguém.
O edifício
não era meu.” (O Nome – Carlos Drummond de Andrade)
Além das infindáveis demolições, sentimentos como a falta de tempo e insegurança em relação à violência são típicos desta nova realidade imposta, em que o homem vem se isolando cada vez mais de seu grupo. Quanto mais o homem se individualizar, menor será a sua memória coletiva, que forma a identidade de uma cidade.
Desaparecendo a memória coletiva, a cidade não deixará de existir. Sua história permanecerá registrada nos documentos e museus.
Mas, desaparecendo os suportes da memória, estaremos perdendo um dos mais importantes elementos de formação do cidadão, no sentido pleno da palavra.
Adorei ver fotos antigas de minha cidade,
ResponderExcluirespecialmente do Colégio Nossa Senhora Auxiliadora,
onde formei-me professôra na turma de 1966.
Verluci Almeida